quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Depois dos 80 km...

Sempre que ouço falar em Quixeramobim, esta cidade parece querer me dizer alguma coisa. Talvez Antônio Conselheiro, quem sabe Euclides da Cunha e até mesmo o saudoso presidente do Clube dos Abestados, a grande figura do médico universal, Pontes Neto, que vi muitas vezes pedir ajuda a Edson Queiroz para construir o hospital de lá. A velha cidade me cola a fantasmas. Passei, certa vez, um dia todo por lá, na casa do ex-ministro da Justiça de JK e de Geisel, que visitou seu ministro, como presidente, na fazenda “Massapé Grande”, enorme, bonita, com capela e tudo no azul e branco, assoalho em madeira nobre, limpo e brilhante que dava para a gente pentear o cabelo. 

O ex-ministro, dos mais bem informados do país, já sabia que Geisel seria substituído por João Figueiredo, o que acabou ocorrendo no Colégio Eleitoral de 1978 para a escolha do presidente por votação indireta. Figueiredo derrotou o general Euler Bentes Monteiro por 355 votos, todos da Arena. O concorrente, do MDB, 226 votos, uma votação acima da esperada, dadas as circunstâncias. Na chapa de Figueiredo, foi eleito o vice-presidente Aureliano Chaves, ex-governador do Estado de Minas Gerais. Aliás, era o candidato de Armando Falcão,  para substituir Figueiredo. Lutou por isso o quando pôde, mas as cartas já estavam marcadas.  Não havia mais o que fazer.

Foi um dia agradável na companhia do ex-ministro, cearense histórico, homem culto e um incomparável articulador político. Escreveu um livro – Tudo  a  Declarar – o avesso da resposta que geralmente tinha para nós, da imprensa, nos piores momentos dos anos de chumbo, quando os candidatos, em obediência à Lei Falcão, só podiam usar na tevê retratos 3X4 e alguns segundos para dizer as bobagens de sempre. Tem hora, por causa do candidatos de hoje, quase sempre meio imbecis, que a gente bem que sente falta da Lei Falcão. O que temos aí, no rádio e na tevê, é um horror, salvo duas-três exceções. Depois seguiram-se Tancredo, diretas-já, Sarney, aquilo que todos sabemos. 

O ex-ministro Armando Falcão me concedeu um entrevista tão importante que ganhou duas páginas inteiras no Diário do Nordeste, em duas edições seguidas. Achei linda, muito bem cuidada, a fazenda “Massapé Grande”. Tirei  foto de um tamarindeiro que tinha completado um século de vida e ganhou até placa da família. Alto, frondoso, belíssimo, cascas grossas que ajudou um botânico saber a idade da árvore. 

No final da tarde, Armando Falcão me levou até o carro, conversou com o motorista e observou: “Olhe, filho, aprenda: um carro, até os 80km, pertence ao motorista; dos 80 em diante, o motorista pertence ao carro, e a partir dos 120km, os dois pertencem ao diabo... 

Nunca esqueci a observação verdadeira. Eu só veria o ex-ministro mais uma vez, anos depois, no seu escritório na Av. Rio Branco, no Rio de Janeiro. Depois, em duas ocasiões, conversamos pelo telefone. Polêmico, odiado, admirado, ele  morreu em fevereiro de 2010, aos 90 anos de idade, em seu apartamento carioca onde morava desde que deixou a atividade política.